sábado, 5 de fevereiro de 2011

O Mestre dos Contrastes

É sempre muito bom poder ir ao CCBB, seja apenas para tomar um café, seja para uma exposição. Neste segundo caso, difícil é ter tempo e principalmente estado de espírito para aproveitar o programa plenamente. Mas felizmente, de vez em quando, conseguimos reunir as condições ideais (ou mínimas) de temperatura e pressão.Foi meu caso no final da tarde de quarta passada, quando vi “O Mundo Mágico de Escher” , que fica até 27 de março no Rio.

Fui direto do escritório, que fica a apenas 5 minutos do local da exposição, e aos poucos fui me desconectando dos problemas nossos de cada dia. Apesar do tempo limitado e espremido por um compromisso em seguida, e a despeito de uma leve concorrência pelo espaço das galerias, deu para penetrar bem no universo do artista, graças não apenas a sua genialidade, mas também à curadoria excelente.

Entre as preciosas informações que ajudam a melhor percorrer o impressionante trabalho do grafista holandês, aprende-se que ele havia uma relação especial com o infinito. Isso é explicitado, por exemplo, em breve nota sobre “Menor e Menor”, cujos temas diminuem de fora para dentro (ou será que crescem no sentido inverso?).

E também sobre “Limite do Círculo (Céu e Inferno) IV”,

cujas figuras, inversamente às da gravura anterior, diminuem à medida que se caminha do centro para os limites exteriores do círculo, que paradoxalmente parecem não existir. Apesar dos temas geométricos diferentes, a relação entre os dois e o infinito é óbvia. Ainda que evidente, talvez esta relação passasse em branco (e preto) pelo consciente do expectador mais apressado que não lesse a preciosa informação. Mas dificilmente ela deixaria de reverberar no inconsciente de quem vê as figuras, ainda que en passant.

E foi exatamente o que aconteceu comigo. Após uma segunda exposição - esta sobre transporte sustentável no Centro Cultural dos Correios - e depois da terceira e última mudança de bar (portanto horas depois de ter visto as gravuras de Escher), a questão do infinito e do inconsciente não pode deixar de emergir do meu.

Aliás, eu já pensava muito no inconsciente como um universo, logo como algo infinito, apesar dele estar fisicamente circunscrito em nossa caixa craniana. Ou não!, talvez dissesse Caetano, inspirado por Jung, segundo quem nosso inconsciente estaria de certa forma conectado ao universo. Ou estarei escrevendo besteira? Pode ser, nunca li Jung, mais uma lacuna a ser preenchida, mas acho que vai por aí sua idéia de sincronicidade.

Naquele momento, em um insight a posteriori, percebi que “Menor e Menor” era, para mim, a imagem clara desse universo circunscrito no cérebro humano, que contrastava claramete com “Limite do Círculo”, para mim a nítida expressão da expansão do universo, como e onde quer que seja seu limite - ou sua ausência, o que é ainda mais angustiante. Ao pensar nesta falta de fronteiras, senti uma espécie de arrepio na coluna e de frio na barriga, que contrastaram com o calor infinito daquela noite na Praça XV.

Preto e branco, dentro e fora, finito e infinito me mostravam a maestria de Escher e de sua arte dos inversos e dos contrastes.

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Hoje Antônio Olavo Pereira, autor de Fio de Prumo, Marcoré e Contramão, completaria 98 anos de idade. Onde quer que ele esteja - próximo, quem sabe, aos limites do universo - estamos conectados.

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